João Fênix por Jean Willys:

Joao Fênix é aquele tipo de artista da música que nos arrebata à primeira audição. E que nos hipnotiza à primeira visão. E não digo isso só por mim. Lembro-me de que na primeira vez em que ouvi João Fênix, eu estava acompanhado de outras quinze pessoas na casa de uma amiga. Esta punha o CD do cantor e compositor pernambucano até então desconhecido para nos mostrar sua música. Assim que começamos a ouvir a interpretação de “Avohai”, ficamos mudos, maravilhados. Não só com a afinação e a capacidade de alcançar notas agudas (algo raro entre cantores), mas sobretudo com a força da interpretação e a criatividade do arranjo. Sentimos que estávamos diante não de algo original (porque o original é uma ilusão; nada é absolutamente original; tudo parte ou se desdobra de algo que lhe antecede), mas de algo novo, naquele sentido em que o novo é um rasura, um desvio, uma invenção à partir do que está aí.

Sim, João Fênix soou novo aos nossos ouvidos. E pareceu novo também quando o vi no palco, partindo do legado de Ney Matogrosso, mas recriando esse legado ao seu modo. Androginia, teatralidade e postura rocker que ora dialogam, ora contrastavam com sua voz. Pensei: Eis aí mais um artista de gênero masculino a contrariar o lugar-comum de que o Brasil é um país de cantoras! E não bastasse o enorme talento de intérprete, capaz de transformar “No Rancho Fundo”, de Ary Barroso, num eletrotango, sem que isso pareça um sacrilégio (ao contrário!), João Fênix é ainda um compositor maduro, com melodias inventivas e letras que flertam com a filosofia.

Ele é um artista no melhor – e quase perdido – sentido desta palavra. Tenho enorme prazer de escutá-lo, de vê-lo e de ser seu amigo.

João Fênix por Samuel Kardos:

Dezembro de 1994

…É um absurdo que um estranho de marré mexa comigo dessa forma; eu mal sei de onde é, não imagino o que você pretende e nem mesmo sei se vais ficar; só sei que teu brilho é mágico, árido e me fascina; é franco e forte, me confunde.

Luz de lua, água de orvalho, céu de inverno/odor de selva. Barra de prata/arco de ouro, mármore negro e de repente areia fina, esparsa relva e desvairada com essência de jasmins, doce sopro de mistério, suavidade, fragilidade que é só força, uma meiguice de criança clemente de compreensão pra solidão do adulto consciente, uma dor imensa que a resignação a Deus foi convertendo em paz e amor à arte foi transformando em luta; e a felicidade de ser possuído por um anjo e num só fio de paixão cantar, falar de vida, o espírito solto voa sobre todos os segredos, esmaga todas as mágoas e ultraja nossos medos mais covardes e num sorrir, semeia uma coragem quase louca abrigando a qualquer um que esteja perto a fazer parte da altiva arte, uma arte corajosa, madura, forte, doce, porém agressiva, meiga, mas decidida.

Coisa esquisita, meu Deus! Você acorrenta as pessoas a si com esse olhar desprotegido que traduz em desespero um pedido de amor. Eu não sei, se você tem esse direito, mas já que o pai da música te deu esse poder, extrapola, abusa dele, continua seduzindo as pessoas, com a força com a qual você me seduziu e arranca delas tudo o que elas não têm coragem de enxergar, tudo o que elas têm medo de sofrer, toda vontade que elas têm de amar.

Vai estranho! Já que é essa a parte que te cabe neste latifúndio: segue, segue!